Thursday, May 11, 2017

Convite para dançar


Milton L. Torres

                Eu fui precoce na minha adolescência. Desde aquela época, meu desejo era encontrar a moça certa e, com ela, constituir família. O problema é que eu era tímido. Morando no subúrbio de Belo Horizonte, a melhor forma de conhecer uma moça era frequentar os bailes do bairro, e era isso que eu fazia. Eu me arrumava da melhor forma que podia, ia periodicamente para os bailes e observava as pessoas, mas sempre me faltava coragem para me aproximar de uma moça e convidá-la para dançar. Sem essa coragem, minhas chances eram mínimas e eu ficava ali, no canto, torcendo para que alguma delas, alta ou baixa, bonita ou feia, se aproximasse de mim e me convidasse para dançar. Mas isso nunca aconteceu. Nenhuma vez. Never ever! Talvez, por isso, hoje tenho uma imensa satisfação quando alguém me convida para dançar.
                Não, eu não virei dançarino. Estou falando metaforicamente. Considero como convite para dançar toda vez que uma pessoa discorda de mim. É minha oportunidade de interagir, expressar minhas ideias, falar de minhas emoções, de certezas e incertezas, de movimentos cadenciados e estéticos, de arte e técnica. Quando alguém discorda de mim, não me aborreço, nem me ofendo. Não me descabelo. Os olhos brilham, o sorriso se estampa no rosto, e começo os meus movimentos, ensaiados e precisos ou espontâneos e instintivos. Às vezes, me esqueço do tempo e do espaço. O foco de minha atenção recai inapelavelmente na escolha das palavras e no prazer de ser diferente, pensar com meus próprios neurônios e assinar, com letras garrafais, o meu próprio nome.
                Assusto-me, ocasionalmente, quando percebo que os outros se sentem atropelados. Detesto ver suas fisionomias carregadas, os lábios apertados e a fronte sisuda e pouco amigável. É como se marcassem o passo com um pé esquerdo cafifento e intrometido que insiste em me pisar um dos pés, na falta do cruzado de direita que poria fim a minha alegria e tagarelice. Dizem que também o boxe é uma dança. Mas não sou pugilista. A minha agilidade se resume ao compasso da fala. Não são estocadas, nem golpes as palavras que uso, mas rodopio e coreografia. Sua intenção é o sensível e o razoável. Seu desígnio e finalidade é o plausível, o imaginável, o presumível!
                Se você me convida para dançar, presumo que goste, que queira, que lhe apeteça. Vou logo lhe tomando a mão, os braços, a cintura, no balé das palavras, no ritmo de nossa sintonia. Por um momento, nos tornamos namorados nos argumentos, amantes nas ideias, afeiçoados no pensamento. E me enlevo tanto, que sou capaz de só lhe soltar a mão, os braços e a cintura, quando estivermos extenuados de mil rodopios e contradanças. A menos... a menos que, como me fez a primeira moça que convidei para dançar uma quadrilha, a razão de meu trauma adolescente, você fique vermelho de pudor e, com um muxoxo, se despeça com um tapa, bem dado, no meu rosto encabulado.