por Milton L. Torres
E se um anjo lhe aparecesse e
dissesse: - Eu não gosto do natal! O que você faria? O que você perguntaria se
tivesse a chance de se aproximar desse ser celestial e lhe indagar as razões de
seu desencanto e decepção com o natal? O que você acha que o anjo que não gosta
do natal lhe diria? Eu posso imaginar o anjo fazendo cara séria, olhando-o
firmemente nos olhos e, com certo ar de reprovação, devolvendo-lhe a pergunta:
- Por que eu deveria gostar do natal?
Essa não seria a hora perfeita
para você desembrulhar suas respostas enlatadas e mencionar que o natal é o
aniversário do nascimento de Cristo, que o espírito de natal enche os corações
de esperança e alegria, que a época natalina é a mais feliz do ano. Anjos são
criaturas muito inteligentes e, provavelmente, o nosso anjo já conhece esses
jargões, já ouviu muitas vezes essas frases serem ditas da boca para fora, sem
nenhum conteúdo emocional ou espiritual. Além disso, em seu íntimo, você sabe
que não é por isso que nosso anjo não gosta do natal.
É melhor revolver o coração e
tentar tirar de lá uma resposta mais sincera e articulada! Vamos, você
consegue! Por que os anjos deveriam gostar do natal quando nós, seres humanos,
o comemoramos da forma mais egoísta e disparatada que podemos conceber. Por que
os anjos deveriam gostar do natal quando, nessa época, nossas preocupações
mundanas se voltam para a glutonaria, a bebedeira, o consumo, a ostentação e,
acima de tudo, a indiferença?
Como podem os anjos gostar do
natal quando, em meio a tanta carência e necessidade de nossos semelhantes,
gastamos tanto com nossos próprios desejos fúteis e fantasias pervertidas?
Quando, em meio a tanta fome, nós comemos e bebemos não como se fosse natal,
mas como se estivéssemos às vésperas do dilúvio ou da destruição de Sodoma e
Gomorra? Quando, diante de tanto sofrimento, nós nos esquivamos do dever para
prosseguir no nosso caminho de levitas e nem damos ouvidos a esses apelos
insistentes de nosso coração de samaritanos?
Apesar disso tudo, você pode
dizer ao anjo que releve! Você pode dizer a ele que siga o exemplo do Pai amado
que, no caso de Abraão, estava disposto a poupar uma cidade inteira por amor a
uma meia dúzia de almas fiéis e puras. Você pode apontar para as crianças e
dizer ao anjo que elas, sim, vivem o verdadeiro espírito do natal porque se
desprendem das amarras dos egoísmos diários para desejar só o bem àqueles que
com elas compartilham a vida. Você pode dizer como nos compadecemos delas e,
por sua causa, nos dispomos aos mais inacreditáveis sacrifícios só para vê-las
sorrir alegres. Você pode apontar para estas pessoas que nos ouvem agora, estas
pessoas que estão aqui, neste lugar, nesta hora, dizendo ao anjo, que,
doravante, nós nos empenharemos, de todas as formas possíveis e imagináveis,
para que os anjos gostem do natal. Pode dizer ao anjo que nós buscaremos, neste
natal, a felicidade do próximo mais do que a nossa própria alegria e que, ao
fazer isso, daremos início a uma corrente do bem, que há de contagiar a todos
os outros seres humanos deste planeta para que, juntos, transformemos o natal
naquilo que, de fato, deveria ser: um natal de anjos!