Sunday, December 17, 2017

Discurso de Formatura para a Turma de Tradutores & Intérpretes de 2017

por Milton L. Torres

         Ser professor é a tarefa mais difícil do mundo, pois nenhum outro emprego exige que nos afeiçoemos às pessoas para, três, quatro ou cinco anos depois, termos essas mesmas pessoas separadas de nós de forma abrupta e, quase sempre, definitiva. Há casos, como o dos enfermeiros, em que genuína afeição acontece, mas por pouco tempo. Não se criam laços, imagino, e as raízes dessa afeição podem ser ternamente arrancadas do terreno fofo em que estiveram plantadas por um intervalo minúsculo de tempo. Com os professores é diferente. Os laços se estreitam, se apertam, se misturam, se entretecem de maneira tão definitiva que é só com sangue que se desfazem, com lágrimas!
         Turma de tradutores e intérpretes de 2017, não quero incomodá-los com os sentimentos de saudade que vocês tão despretensiosamente nos impõem hoje. Afinal de contas, a ocasião exige um espírito mais alegre, um vislumbre mais venturoso do futuro e da vida!  Não estamos aqui para lamentar essa cúmplice proximidade que, sob Deus, nos uniu para sempre, mesmo à distância de milhares de anos-luz, mesmo sob os escombros debaixo dos quais enterramos hoje esses sentimentos de falta e perda! Pelo contrário, estamos aqui para celebrá-los. Estamos aqui para celebrar que não serão mais forçados a fazer nenhuma interpretação sob o crivo de um professor dedicado, mas exigente. Estamos aqui para celebrar sua vitória na impecável, ou quase impecável, apresentação do TCC. Estamos aqui para celebrar o fim de projetos integradores e provas interdisciplinares que portam o exótico nome de uma velha tia rabugenta! Estamos aqui para celebrar que não precisarão entregar nem mais uma linha para a Ana Schäffer, nem mais um memorial para a Tania Torres. Estamos aqui para celebrar que não terão que cantar nem mais uma música para o Édley, não terão que representar nem mais uma peça de literatura brasileira, portuguesa, inglesa, norte-americana ou grega! Não terão!
         O que vocês terão que fazer, doravante, será muito mais complexo e desafiador. Vocês se emaranham hoje nesta impenetrável, inquebrantável, inesquecível teia de sentimentos e sonhos. Resta-lhes, a partir de hoje, um único professor: a vida! Resta-lhes, a partir de agora, uma única prova: o caráter! Resta-lhes, a partir de agora, um único olhar em direções comensuráveis: para frente, para o alto, para dentro, para o amanhã. Não há como prever quantos viverão, quantos sobreviverão, quantos serão, de novo, amados e quantos amarão. Só posso, ao invés de lhes dar essas garantias, convidá-los a olhar para trás toda vez que forem tentados a ceder à dúvida. Lembrem-se do orgulho com que cada professor os observa hoje. Lembrem-se do meu tom de voz. Lembrem-se! Porque, ainda que se passe uma eternidade até o nosso próximo encontro, seus nomes agora têm significado: Marina, Débora, Giovana, Naty, Vítor, Hanna, Karina, Luma, Laíza, Alexandre, Benjamin, Viviane, Thaís, Évelyn e César. Essas palavras deixaram de ser meros hipocorísticos, como diria a Naty, e se transformaram em nomes mágicos, abre-te-sésamos da minha vida.
         Obrigado por vocês existirem. Obrigado por vocês terem trazido riquezas incalculáveis para a vida no aquário. Obrigado por vocês tangerem, hoje, tão profundamente as cordas que embalam o nosso sonho, que é, principalmente, ter-lhes ofertado de volta um pouco do muito que vocês nos concederam com seus sorrisos, olhares, gestos, perdões e, acima de tudo, sua atenção benevolente. Sentimos que, de modo estoico, vocês se esforçaram para ouvir nossas historietas, essas bravatas e lugares-comuns com as quais entupimos seus ouvidos e mentes. Vocês nos fizeram sentir importantes. Isso só demonstra sua nobreza e aptidão para o bem, herança certa e líquida da educação que receberam em casa.
         Vocês vão agora e levam consigo um pedaço grande do nosso coração, provavelmente os 250 gramas que o Mercador de Veneza recomenda. E nós, professores e amigos, ficamos aqui para viver a vida com os 50, 60 gramas de coração que nos restam. Não precisam inventar novas tecnologias, não precisam fazer propaganda enganosa, não precisam descobrir a cura do câncer, não precisam ficar milionários antes dos quarenta anos de idade nem serem os primeiros astronautas a colocar os pés em Marte. Não precisam. Podem até fazer essas coisas. Mas não precisam. Considerem esse volume do nosso coração como um empréstimo, a peso de ouro, cujo pagamento exige apenas uma coisa: que vocês sejam felizes!





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