por
Milton L. Torres
De vez em quando
converso pelo whatsapp com uma incrível moça de Minas Gerais chamada Samilly.
Ela é inteligente, sensível e tem um papo muito cabeça, exceto quando começa a reclamar da vida. Nesses momentos, eu geralmente a interrompo e
procuro reacender uma centelha brilhante que, às vezes, fica escondida no
coraçãozinho dela. Aí eu começo a falar de coisas boas. Ela fica mal-humorada
por alguns minutos, mas, no fundo, no fundo, eu sei que ela concorda comigo e
que fica me contrariando só para fazer a conversa render. Ao falar de coisas
favoritas, ela nunca consegue mencionar mais do que duas, lamentando-se de que
as coisas simplesmente não a empolgam mais. E eu quase que escuto o coração
dela batendo, pois sei que dentro dele palpita vida como ela nunca seria capaz
de imaginar, essa centelha que certamente renderia um fogo consumidor, até uma
grande paixão, expectativas e sonhos além da imaginação.
Eu decidi pensar
em dez coisas favoritas capazes de fazer o coração da Samilly ganhar novo ânimo
e encher-se de desejo pela vida. Não apresento a lista numa ordem coerente ou
gradativa. São só as coisas que me entusiasmam e me fazem querer viver e ser
feliz, coisas com as quais gostaria de infectá-la.
Em primeiro
lugar, tiramisu, a sobremesa favorita de Jesus: melhor do que sorvete, torta
holandesa, ou qualquer coisa que a imaginação colorida dos cozinheiros gourmet
consiga conceber. Ou, em vez disso, macarronada cheia de cogumelos e
manjericão...
Em segundo lugar,
disputa de pênaltis, quando a bola na marca da cal decide se a gente fica ou
vai embora, se comemora o campeonato ou se recolhe à melancolia profunda dos
perdedores.
Em terceiro
lugar, uma criança no colo, ensinando os recomeços da vida, os braços
estendidos com sinceridade, os incansáveis beijos repletos da admiração
evocativa daqueles que são puro sonho e fantasia. Ou, nesse mesmo colo, um
cachorrinho, em vez disso, com afagos e carinho, o ser humano mais completo que
já conheci...
Em quarto lugar,
um filme de ficção científica em que a raça humana se salva por um triz na
guerra dos mundos, a tela bruxuleante e hipnótica da qual não se pode desviar o
olhar por um segundo sequer.
Em quinto lugar,
um livro: de Lucrécio, Guimarães Rosa, Nietzsche ou Homero. Algo épico,
grandioso, cujas páginas se enchem de emoções e conflitos, tudo resolvido sob o
beneplácito dos imortais, sejam eles divinos ou humanos.
Em sexto lugar, um
passeio de carro num dia ensolarado em que, nenhuma preocupação nos acompanha,
a não ser a estrada, quando o vento nos despenteia o cabelo pela janela aberta
e nem nos incomodamos com isso.
Em sétimo lugar, o
beijo no pescoço, com os calafrios que o acompanham, prenúncios de prazeres
maiores e irrevogáveis, o cheio adocicado do perfume, os frêmitos, o gozo já
antecipado.
Em oitavo lugar,
o apelo do sermão, quando, vulnerável e atento, o coração aspira a novos
horizontes, uma sobrevida eterna, a companhia dos anjos, enquanto o coral canta
de ondas e mar, a travessia para o outro lado.
Em nono lugar, o
vislumbre da janela do avião, quando o destino é um paraíso tropical, Punta
Cana ou Cancun, e você imagina como é possível que voe numa máquina mais pesada
do que o ar, porém se lembra, então, de que a vida tem suas dores, mas é também
cheia de prazeres...
Em décimo lugar, uma
canção dos Beatles, com a ingenuidade lírica dos que só querem e buscam o bem,
a paz que se imagina, um céu de diamantes, o submarino amarelo, segurar a mão,
enquanto a guitarra quase que adormece gentilmente sob o sentimento do coro,
mesmo que você tenha ou se sinta com 64 anos de idade.
Não sei se a Samilly
já experimentou tudo isso ou a metade disso ou duas dessas coisas ou pelo menos
uma delas, umazinha só. Quando eu a leio, ou vejo, ou ouço, eu só posso desejar
que ela o faça. Se ela o fizer, essa cabecinha, às vezes tonta e cheia de
devaneios, e esse coraçãozinho, às vezes apertado e triste, vão lhe abrir os
olhos para que leia, veja e ouça como eu a leio, vejo e ouço: uma moça cheia de
vida que tem tudo para ser feliz e com quem eu, alegremente, trocaria de lugar
quando, onde e por tanto tempo quanto ela quisesse, para ser Samilly, jovem,
linda, cabeça de vento, coração de palha, para me contrariar e contradizer,
para experimentar, de novo, como se pela primeira vez, cada uma das dez coisas
favoritas.
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